terça-feira, 8 de junho de 2010

Intersecção

ow to write a documentary script? de Trisha Das e o documentário Edifício Master de Eduardo Coutinho são duas aulas de como se fazer roteiros para documentários. É inevitável, de início, desconfiar: como ensinar algo que não possui forma até ser feito? Trisha responde teorizando sobre o que já foi filmado; Coutinho, filmando.
Enquanto Trisha Das tem uma teoria relativamente complexa, com regras e estilos, Coutinho é a personificação da prática (que não deixa de ser um estilo). No entanto, ainda que em estilos bastante distintos, há um sinequismo (aproveitando o termo da semiótica peirceana que embasa alguns aspectos da teoria de Trisha) nas lições de ambos, mostrando que concordam em muitos aspectos.

As sete considerações que Trisha sugere para o documentário são exemplarmente exploradas por Coutinho em sua produção. A segurança do cineasta ao lidar com a flexibilidade do gênero, refletida na preocupação em adaptar o filme ao conteúdo captado, ao invés de tentar encaixotar os depoimentos num formato pré-estabelecido, deixam evidente que o tema da filmagem - os moradores do prédio - sobrepõem-se a qualquer outro fator.
A voz dos entrevistados é quase todo o áudio do documentário, salvo pelas curtas perguntas dos entrevistadores (e a canção de Frank Sinatra, claro), o que limita o controle do documentarista mas sustenta a credibilidade dos depoimentos. O movimento, a fluidez do filme, é garantida pela própria eloquência dos entrevistados, quando não pelos raros cortes. A liberdade que os personagens se manifestam preserva a autenticidade das emoções captadas.

Contudo, a maior proximidade entre a prática de Coutinho e a teoria de Trisha está nos métodos de pesquisa. Trisha declara que quanto melhor for esta pesquisa, maior será o valor do filme. E especifica mais adiante que, mesmo relevando significativamente a consulta a livros e filmes que trataram anteriormente sobre seu tema, é importante entrevistar as pessoas , ter perspectivas variadas do tema que vai ser tratado. A quantidade de entrevistas que a equipe de Coutinho realiza na comunidade do edifício master é bastante significativa. O material coletado, além de apresentar profundamente os personagens do documentário, permite imaginar o cotidiano daquele condomínio. E tudo que foi produzido ali é fruto maior dos moradores que de Coutinho, justamente pela maestria com que ele permitiu que as coisas acontecessem naturalmente.

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