segunda-feira, 31 de maio de 2010
Personagem ou não personagem... Eis a questão!
Desvendar os mistérios por detrás das câmeras é sempre curioso e instigante. É sempre desconhecido o trabalho que o diretor, o roteirista, a equipe toda, enfim, teve antes de lançar o “bolo” pronto. Pois cada curta, longa, documentário ou qualquer gênero que seja é vivido de uma forma diferente; as vivências e as experiências vão se tornando parte daquilo que antes fora pensado. Uma ideia nunca será pronta. O ponto final nem sempre é feito da maneira que esperávamos, quem dirá o conteúdo em si. Não há trabalho que seja igual e, às vezes, nem semelhante. Não existe receita para se criar. A flexibilidade de observar e mudar e acrescentar e tirar informações e imagens deve existir o tempo todo como possibilidade.
É exatamente isso que sentimos quando adentramos a parede que separa a “ficção” do real, o “antes” do “depois” no making off do documentário Edifício Máster, do diretor Eduardo Coutinho, lançado em 2002. A agonia de não saber como será o ponto e, muito menos, o caminho a ser seguido é uma individualidade deste trabalho do autor – quem sabe se não o é em todos? Coutinho se mostra agoniado, irritado e, até mesmo, estressado a princípio. A equipe passa por muitas “crises” sobre o próprio filme que ainda não é filme e as personagens ainda não estão escolhidas.
Aliás, a escolha das personagens feita por Coutinho é algo profundo e trabalhoso. Quem vale à pena? Quem é uma personagem? Nesses momentos, vemos que a “ficção” é buscada e introduzida no contexto. Para uma comparação mais palpável, essa busca de personagens acontece assim como no Jornalismo Literário, encontrado no jornalismo impresso: ilustrar histórias de pessoas comuns, com uma linguagem real de uma forma cativante exige muita sensibilidade.
Ao longo do tempo e das entrevistas feitas – momento em que Coutinho se mostra mais seguro e otimista – a pergunta “o que é esse documentário?” vai sendo encontrada e respondida de forma natural. Aí, a partir disso, o diretor se inspira e em certo momento solta um “isso é pura ficção!!”. O que sentimos com isso é que a forma com que se faz um documentário é algo importante e que traz personalidade ao que é feito. Mas, o que mais interessa é o conteúdo conseguido. É a forma com que se conquista cada segundo de material cativante, de entrevista bem feita. A essência do documentário está na essência das personagens e das pessoas que o produzem.
Coutinho é hoje um dos nomes de maior destaque dentre os documentaristas. Talvez – ou com certeza – essa forma de ele olhar o mundo, de encontrar boas histórias em um “cortiço de Copacabana” o faz ser quem é e a conquistar o público que se encanta com suas personagens da vida real.
Os tópicos de Tricha Das valem para os documentários de Coutinho?
Maria Carolina Vieira RA: 830674
O documentário “Edifício Máster” de Coutinho apresenta algumas características peculiares para o gênero. Não se trata de uma história linear que contém um tema central que se mostra na tela, e sim de fragmentos de histórias de vida, de pessoas totalmente diferentes entre si habitando no mesmo lugar. Juntam-se todos esses depoimentos e só assim temos um tema: o Edifício Master. Embora este conduza e ligue cada parte do documentário, ele não é o personagem principal. Cada um que fala, cada momento ou trecho transforma aquelas pessoas comuns em personagens principais do filme. Portanto, mesmo que num primeiro momento o próprio condomínio pareça ser o ponto chave do documentário, são os personagens que dão vida a ele: o tópico o tema é o principal não condiz com “Edifício Máster”.
Outro fato peculiar, desta vez em relação à produção do documentário, é que ele não é fechado, já que a equipe chega ao local de filmagens quase totalmente às cegas e somente aí começa a levantar possíveis personagens e maneiras de se construir o filme. Eles não tinham idéia para onde a história seria conduzida. Neste ponto, “Edifício Máster” cumpre com o tópico de Tricha Das, pois ele é flexível. Só que esta flexibilidade não é sinônima de desorganização ou falta de direção. Ainda que os personagens (e suas histórias) que construíram “Edifício Máster” fossem uma caixinha de surpresa, quem e cada trecho de fala relevante para o filme foram selecionados, e a filmagem e a condução de cada depoimento foi devidamente dirigida, o que nos leva a concluir que o tópico envolve menos controle não condiz com a realidade.
Talvez o que Tricha Das considere como ter menos controle é o fato da produção não ter o poder de modificar ou interferir imensamente na realidade, partindo-se do suposto que documentários tratam de fatos e não de ficção. Coutinho cumpre com esse tópico, pois o que torna “Edifício Máster” digno de ser lembrado é a veracidade transmitida pelas histórias de vida dos personagens escolhidos. Se não fossem verdadeiras, não teriam graça, já que qualquer um poderia inventar uma narrativa fantástica. Sendo assim, credibilidade é a chave, e Coutinho consegue trabalhar muito bem com isso.
Ele trabalha muito bem, também, com o tópico a forma é mais importante que a fórmula. Isso quer dizer que, se seu documentário fosse organizado de outra maneira, dando menos espaço aos próprios personagens (mesmo que explorasse o universo do condomínio e dos depoimentos) talvez não conseguisse chegar ao público como chegou.
Por fim, o tópico inspira movimento e ação não pode ser atribuído ao documentário de Coutinho, pois ele aborda uma realidade praticamente estática (pessoas falando de vivências dentro de seu lar, com a semelhança que moram todas no mesmo condomínio). A única coisa que se pode notar é que, embora, cenicamente, “Edifício Máster” não mostre movimento, as narrativas dos personagens inspiram o público a criar ação em seu próprio imaginário (como eles contam fatos de suas vidas, levam o público a encenar mentalmente o que foi somente contado e não encenado).
Edifício Master: uma análise a partir de Trisha Das
A partir da observação das gravações do making off do documentário Edifício Master, de Eduardo Coutinho, será feita uma comparação entre as afirmações de Trisha e da composição do documentário do roteirista brasileiro:
- “O tema é o principal”. Certamente. Como pode-se perceber nos bastidores do Edifício Master, depois que o tema é escolhido, ele é levado até o final. Como aparece no making off, a equipe de Coutinho afirma que não sabiam se gravariam apenas no edifício Master ou se teriam que procurar mais um condomínio de apartamentos, o que significa que o objetivo, que era o de entrevistar diferentes pessoas que moram em um mesmo prédio, estava determinado. Para cumpri-lo, não importava quantos prédios teriam de procurar.
- “A chave é a credibilidade”. Mais uma vez Coutinho e sua equipe agem conforme os princípios de Trisha. Nenhum entrevistado foi filmado logo de início. Antes de gravar com cada um, houve uma entrevista inicial, uma espécie de bate-papo. Tanto para avaliar se a história daquele morador seria útil para o documentário, tanto para mostrar que o que estava acontecendo ali era um trabalho sério.
- “A forma é mais importante do que a fórmula”, “é flexível”. A primeira questão talvez deixe um pouco de dúvida. Se o que Trisha quis dizer com a afirmação é que o mais importante é O QUE será feito do que COMO será feito, parece que a equipe de Coutinho se portou como tal. Com base no que já foi dito na primeira afirmação, fazer o documentário é o mais importante. Eles tinham uma ideia e sabiam que precisavam fazer um documentário, ainda que o tema final não fosse conhecido. Ou seja, embora não tivessem certeza de como seria o produto final, tinha absoluta certeza que nasceria um documentário. Logo, é também flexível e, de quebra, “é um formato que envolve menos controle”. Afinal, ao decidir por fazer um documentário, o roteirista tem uma ideia inicial, que nem sabe se pode se concretizar. Como no caso de Coutinho, ao mesmo tempo em que ele e sua equipe pesquisavam, iam traçando a história a ser contada. Ou seja, não está nas mãos do diretor dizer aos entrevistados “agora você fala isso e faz aquilo”, é a partir das entrevistas que vai se descobrir se a ideia de tema inicial pode gerar um tema legal de trabalho.
- “Trata de fatos e não de ficção”. É desta forma que Coutinho trabalha durante toda a produção do Edifício Master, no entanto, ele busca tratar de fatos de modo a torná-los interessantes como se fosse ficção. Pois, que graça teria entrevistar pessoas com histórias absolutamente normais? Desta forma, Coutinho tem o cuidado de procurar histórias diferentes, como a de uma moça que é prostituta, de outra que tem fobia social etc. Ou seja, apesar de se tratarem de fatos, são parecidos com a ficção e expostos de modo a se tornarem interessantes.
Conclui-se assim que Edifício Master segue a fórmula de documentário de Trisha, principalmente porque no making off é possível perceber as incertezas de Coutinho, a preocupação com o produto final, a necessidade de se encontrar pessoas com boas histórias e dispostas a falar, sempre na busca de se obter bons materiais para a produção de um bom resultado.
domingo, 30 de maio de 2010
Edifício Master – análise da construção de um documentário
Ao assistir o making of do documentário “Edifício Master” de Eduardo Coutinho e compará-lo ao produto final, é possível perceber alguns aspectos pontuados em “How to write a documentary script”, de Trisha Das.
São esses aspectos: o tema, a credibilidade, forma X fórmula, relação entre fatos e ficção, movimento e ação, a flexibilidade e o menor controle sobre a obra.
No making of fica nítida a importância de cada um desses fatores. O tema, por exemplo, já existia. Coutinho sabia o que queria fazer, mas não tinha certeza se daria certo. Falar sobre o condomínio? Sobre as histórias que ali se passaram? Ou sobre as pessoas, que ali vivem? Afinal, elas não são celebridades, mas não deixam de chamar a atenção para a sua vida. O tema surge conforme vão surgindo as histórias. Nesse meio tempo, percebe-se não só a relação entre fatos e ficção, mas também o menor controle sobre a obra.
A relação entre fatos e ficção aparece justamente nas histórias contadas pelos moradores, e Coutinho percebe isso. No final do making of, quando um deles canta “My Way”, o documentarista grita que aquilo é “pura ficção”, talvez pelo fato dele mesmo pedir a música e criar a cena. E não é só. Sendo contadas as histórias, são criados personagens, as personalidades do “Edifício Master”. Sobre a falta de controle da obra, realmente, no início Coutinho estava perdido, não se mostrou amigável e não sabia que caminho seguir, mas conforme foram surgindo pessoas com histórias interessantes pra contar, o cenário foi se constituindo.
A credibilidade, o movimento e a ação aparecem com o todo o cenário construído. Um documentário que passa credibilidade é aquele que mostra o contexto exatamente como ele é. Coutinho conseguiu isso retratando as pessoas verdadeiramente. No making of é possível perceber a liberdade dada aos personagens do documentário, já que eles contam suas histórias como elas realmente aconteceram, sem restrições. O movimento e ação, por sua vez, se dão nas próprias histórias e na busca por elas. A equipe tenta conseguir personalidades que prendam a atenção de quem for assistir o documentário, e com isso dão ação e movimento às filmagens, o que pode ser percebido no produto final.
Por fim, a flexibilidade e a relação forma X fórmula também são percebidas ao comparar o documentário em si, com o making of. A fórmula pronta para se fazer um documentário acaba perdendo a validade, já que se o produto for igual a qualquer outro, pode deixar de ser interessante e único. A forma como ele é feito, porém, pode chamar a atenção e resultar em um documentário com suas próprias peculiaridades e pontos que prendem o olhar de quem o assiste. Neste aspecto é importante a flexibilidade, para entender o que é melhor, o que é mais fácil ou difícil, o que vai qualificar a obra etc, sem se prender a conceitos.
O documentário “Edifício Master” o seu making-of mostram a ousadia de um cineasta que apesar de ter uma idéia boa, não sabia o que ia encontrar. Com todos os aspectos citados acima, entre os mais nítidos a flexibilidade, o movimento e a credibilidade, Coutinho conseguiu um produto que nem ele podia imaginar produzir, vide a insegurança mostrada no making-of. Acredito que o modo como ele entrou na vida daquelas pessoas e a segurança adquirida ao longo das filmagens, resultaram num documentário que consegue enriquecer o inexplorado e a realidade muitas vezes distante das câmeras.
quinta-feira, 27 de maio de 2010
O documentário e “Edifício Master”
Edifício Master (2002), de Eduardo Coutinho, é um documentário que mostra as diferentes histórias de moradores de um prédio, localizado em Copacabana, no Rio de Janeiro.
Pode-se dizer que a temática é a diversidade de histórias, de vidas, de indivíduos que moram uns do lado dos outros e nem sequer se conhecem. Mas seria o tema o aspecto principal de um filme? Eu acredito que não: quando vamos assistir a uma produção cinematográfica, o que nos chama a atenção é obviamente do que a obra trata, mas não o que nos faz ficar sentados durante toda a projeção. Claro, contar várias histórias para um documentário parece interessante, mas se assistíssemos a narrativas monótonas e triviais, certamente não assistiríamos ao filme inteiro. Para mim, a abordagem do tema é mais importante que o tema em si.
Se vamos assistir a um documentário, esperamos ver situações reais (caso contrário, optaríamos por um filme de ficção) e conhecer mais da nossa realidade. Por isso, credibilidade deve ser um valor levado em conta na hora de se filmar um. Ninguém vai valorizar o filme se não acreditar no que se passa na tela. Em Edifício Master, essa credibilidade é alcançada ao deixar os próprios moradores falarem – desse modo, seus discursos parecem autênticos. Eles são apenas direcionados pelas perguntas de Coutinho, mas isso não compromete em nenhum aspecto o longa.
Não gosto do termo “fórmula”, porque ele não abre espaço para criatividade, inovação, descoberta. Infelizmente, fórmulas de como fazer documentários são usadas por muitos cineastas até hoje. A forma de um filme, para mim, é mais importante, porque é o que o espectador vai ver diretamente, é o que pode diferenciar um filme dos outros. A fórmula restringe um filme a coeficientes, e uma obra é muito mais complexa do que isto.
Concordo apenas em parte com a afirmação “O documentário trata de fatos, não ficção”. Se eu pudesse reescrevê-la, seria assim: “O documentário trata de fatos, fazendo uso de elementos narrativos”. O público está bem mais acostumado a ver filmes de ficção do que documentários – talvez este seja o maior motivo pelo qual exista uma certa estrutura narrativa neste tipo de filme. Podemos observar que, em documentários, há a construção de personagens (em Edifício Master existem muitos), contextualização de um conflito, e a resolução ou não deste - todos elementos que aparecem em quase todos os filmes de ficção. Então, creio que a linha entre documentário e ficção é bastante tênue, e não deveríamos nos apressar em classificar um filme como “ficção” ou “documentário”. As duas categorias se complementam.
Já quanto à flexibilidade do documentário eu concordo plenamente. Este não possui o conforto dos filmes de ficção, que geralmente são gravados em estúdios e com o roteiro pronto. Como se está lidando com a realidade, o cineasta é muito mais livre para fazer suas escolhas de como filmar, qual sua abordagem da temática. Por outro lado, há pouco controle na hora de realizar um documentário: tudo pode acontecer, e nesse “tudo” incluem-se coisas ruins como não se conseguir depoimentos suficientes, falta de autorização para captar imagens, etc. Lidar com a realidade te dá liberdade, mas também exige mais cuidado na estruturação do documentário.
Finalizo este texto com a declaração que o documentário “inspira movimento e ação”. Talvez ela se refira ao modo como os documentários são filmados: eles carecem de pesquisa, de muito esforço, de criatividade e muito talento, principalmente.